A União Europeia atrasa acordo com o Mercosul e pode perder espaço no comércio global


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Após 26 anos de negociações, o Acordo entre a União Europeia e o Mercosul continua sem avanços. Ursula von der Leyen, presidente da Comissão Europeia, anunciou que a assinatura do documento não ocorrerá no dia 20, em decorrência de pressões de países como França e Itália. Essa decisão não apenas revela um impasse comercial, mas também evidencia uma Europa desconectada das novas dinâmicas do comércio internacional.
Os produtores franceses argumentam que o Brasil não atende aos mesmos critérios ambientais exigidos na agricultura europeia. Contudo, essa justificativa se mostra frágil, desconsiderando diferenças geográficas e estruturais significativas.
O Brasil mantém cerca de 70% de sua vegetação nativa, um percentual que não se compara ao da Europa. Além disso, o país não está entre os maiores emissores de carbono, uma posição que é ocupada pelos países industrializados europeus ao longo do tempo. Exigir padrões equivalentes entre regiões com realidades climáticas e históricas tão distintas é uma forma de protecionismo.
O receio é econômico, não ambiental
O Brasil e seus parceiros do Mercosul são altamente competitivos em produtos como soja, milho, carnes, algodão e café, cujos mercados não competem diretamente com a agricultura europeia, que é mais voltada para produções em pequena escala e dependente de subsídios significativos.
É paradoxal que, mesmo assim, os consumidores brasileiros frequentemente encontrem produtos europeus a preços menores, resultado de um sistema comercial protegido.
Ao postergar o acordo, a União Europeia não está protegendo o meio ambiente ou seus agricultores, mas apenas adiando uma adaptação necessária à realidade global.
O cenário mundial é de mudanças rápidas. Enquanto os Estados Unidos se direcionam para o unilateralismo e a China avança em tecnologia e investimentos, a competição por mercados se intensifica. Sem o acordo com o Mercosul, o maior bloco comercial em negociação, que envolve aproximadamente 700 milhões de pessoas, a Europa corre o risco de perder sua relevância econômica e geopolítica.
Para a Europa, o acordo é estratégico. O Mercosul representa um mercado importante e uma alternativa à crescente dependência da China. Sem esse acordo, há a possibilidade de que a influência da China e dos EUA na América do Sul aumente, enquanto a Europa observa à distância.
Embora o Brasil não dependa do acordo para sua sobrevivência, a sua realização poderia facilitar o acesso aos produtos e serviços industriais da Europa, promovendo ganhos de competitividade interna. A demanda por alimentos na Ásia continua em alta, impulsionada pelo crescimento populacional e aumento da renda.
Atualmente, a União Europeia parece refém de interesses internos, sem capacidade de tomar decisões estratégicas a longo prazo. Ao transformar questões ambientais em barreiras comerciais, o bloco opta pelo isolamento e sacrifica sua competitividade e progresso tecnológico.
No comércio global, quem se isola do concorrente mais eficiente não se fortalece, mas fica para trás.
Por Miguel Daoud, comentarista de Economia e Política do Canal Rural