Decisão do STF sobre marco temporal gera incertezas para indígenas e agronegócio
Mudança na legislação pode impactar a segurança jurídica e a economia rural


Foto: STF/divulgação
A recente decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) que derrubou o marco temporal relacionado às terras indígenas evidencia mais um posicionamento político do que uma solução efetiva para os desafios enfrentados pelos povos originários. Ao permitir a ampliação das demarcações sem considerar o marco constitucional de 1988, a Corte não aborda as questões fundamentais que afetam os indígenas, alterando apenas a narrativa.
Atualmente, cerca de 14% do território nacional é destinado a terras indígenas, porém, as condições de vida nessas áreas são alarmantes, com relatos de crianças passando fome, carência de serviços de saúde, e a presença de atividades ilegais como garimpo e desmatamento. A ampliação das terras, por si só, não trouxe dignidade ou cidadania.
Ademais, essa situação transforma a questão indígena em um instrumento de interesses externos, com ONGs utilizando as comunidades como forma de angariar recursos, sem que isso melhore efetivamente a vida nas reservas. A relação entre terras e a presença do Estado é inversamente proporcional: mais terras, menos assistência governamental.
O Brasil, neste momento, carece de recursos financeiros e administrativos para proporcionar condições dignas nas terras indígenas. A falta de serviços básicos e a dificuldade em indenizar produtores rurais cujas terras possam ser desapropriadas criam um cenário de crescente insatisfação e conflito.
A decisão do STF, apesar de buscar preservar os direitos dos povos originários, ignora a necessidade de ações concretas em áreas como educação, saúde e segurança, além de aumentar a insegurança jurídica e afetar os investimentos no agronegócio, setor vital para a economia do país.
O Senado está atualmente tentando elaborar uma legislação que busque um equilíbrio entre os direitos dos indígenas e a viabilidade econômica. No entanto, a eficácia dessa abordagem ainda é incerta. O que se observa é que decisões políticas disfarçadas de soluções jurídicas não resolvem os problemas enfrentados pelos povos indígenas e podem criar novas dificuldades para o Brasil.
Com a derrubada do marco temporal, o STF não fortaleceu os povos originários, mas sim afastou o Estado, aumentando a dependência e fragilizando tanto os indígenas quanto o agronegócio.

Miguel Daoud é comentarista de Economia e Política do Canal Rural